Por Cássio Felipe
Foto: Márcia Guena |
Ali, Dona Ovídea foi criada pelos seus pais Domingos Firmino de Sena e Isabel Siciliana de Sena, também filhos da comunidade. Mesmo sendo a caçula das filhas, sua infância foi tecida, além das brincadeiras, pelo trabalho duro na roça, ajudando seus pais no cultivo e na venda, em Juazeiro, de coentro, pimentão, batata e mandioca.
Dona Ovídea estudou até a quarta série no Rodeador. Desde cedo, queria ser professora e, só com a quinta série, conseguiu uma vaga para lecionar na escola da comunidade. Mais tarde, concluiu o segundo grau, o ensino fundamental e médio. Lecionou durante 33 anos no Rodeador e ainda dava aulas em outras escolas do entorno. Aos 60 anos, é aposentada, mas a disposição da criança que ajudava os pais a cultivar a terra, plantar verduras, praticar pecuária e fazer farinha de mandioca no quintal da sua casa, não acabou. Cuida da casa, do primo e companheiro com quem é casada há mais de 40 anos, dos filhos e dos netos que moram com ela. Além disso, também luta pelos direitos da comunidade negligenciados pelo Estado e município.
Desde pequena, Ovídea desenvolveu uma profunda fé católica e dedica boa parte do seu tempo a grupos religiosos: peregrinação da Mãe Rainha, Coração de Jesus, Terça dos homens, Alimentadeiras de Almas... uma infinidade de movimentos. É também responsável pela igreja da comunidade e presidenta do grupo Legião de Maria. Rememorando os tempos de criança, recorda que, ao terminar das refeições, ela e suas irmãs precisavam fazer a reza que seus pais as ensinaram. Aos sábados, acordavam às cinco horas para rezar o Ofício de Nossa Senhora e, em outubro, na véspera do padroeiro da comunidade, São José, iam todos à missa.
A tia de dona Ovídea, Francisca Sena, praticava uma manifestação cultural que existe até hoje no Rodeador: o batuque, oriundo do Reisado. Ele acontecia na peregrinação dos Santos Reis que ainda acontece no mês de janeiro de cada ano. As pessoas visitam casa por casa da comunidade cantando cantigas religiosas. Hoje, o “batuque” virou Samba de Véio, manifestação cultural que comunga a pluralidade de identidades que coexistem no território do Submédio São Francisco.
A batida nos tamboretes, a força dos pés no chão, a lata na cabeça e a beleza das cantigas dos Santos Reis demonstram a forte presença negra, sertaneja e indígena do território. Com o falecimento de Francisca, dona Ovídea, que seguia os passos da tia, começou a sambar com dez anos e de lá para cá, não se deu muitos descansos longos. Tomou para si a missão de tocar o samba e ser uma das enfrentante das rodas de Samba de Véio do Rodeador.
- Pra mim, é um tipo de uma animação, muitas vezes você está tá muito abatido e você vai fazer um movimento desses, assim, é aquela alegria para gente, né.
Que lindeza de história. Dona Ovídea é uma mulher negra, que dentre tantas outras nesse solo ribeirinho e sertanejo, resiste.
ResponderExcluirLindeza de trabalho, Cássio. Beijos <3
Excelente trabalho! Parabéns!
ResponderExcluirMuito lindo. Conhecer Dona Ovídea foi uma das coisas mais linda que pude ganhar durante o V ENCOMUN (2016) , em Juazeiro. Muita sensibilidade esse trabalho. Cássio, meu véio, parabéns.
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