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Foto: Arquivo Pessoal |
Por Victória Resende
Lizandra Martins parece ser feita
inteirinha de retalhos. De fragmentos da infância pelas ruas da Petrolina
Antiga, das orações sussurradas por sua mãe quase rompendo o silêncio
adormecido da casa, das canções de Jorge Ben bailando no toca-discos. Caleidoscópica,
carrega consigo muitas cores. As cores das ruas de Ouro Preto, seu sonho de
menina, e as cores da efervescente Avenida Paulista. Petrolinense, ribeirinha,
sertaneja. Parece não caber nos seus 23 anos, então transborda. Através da
arte, seu dicionário sobre este mundo que, às vezes, parece um emaranhado
complicado demais de se compreender.
Ao ser questionada sobre a sua relação com
a fotografia, sorri. Eduardo Galeano, jornalista e escritor uruguaio, certa vez
escreveu que recordar é voltar a passar pelo coração. Conta que, quando
criança, costumava brincar de registrar momentos com a câmera analógica da sua
mãe, Dona Ilza. Mas somente alguns anos mais tarde tomaria gosto pela arte que
hoje carrega como profissão.
Saía pela cidade em pequenas expedições
fotográficas. Escrevia Petrolina com luz. Utilizava o equipamento dos amigos
para fazer os registros. Até que decidiu adquirir a própria câmera compacta,
que perdeu em seguida. E embora a definisse como “simples e bastante precária”,
foi essencial para que se interessasse ainda mais pelo estudo e prática da fotografia.
Confessa que olhar através das lentes lhe
permitiu o reencontro com algo muito precioso: suas raízes. Relembra dois
momentos especiais neste processo: o primeiro, é o ensaio “Mãos Sertanejas”,
que iniciou na Oficina do Artesão Mestre Quincas, em 2012. “Agora eu vou lá e às vezes nem levo a câmera”. Chega, reencontra
os amigos artesãos, prepara um café, escuta suas histórias. Se apaixonou pelo
local.
“Me identifiquei com o trabalho dos artesãos,
com o que eles retratam. Comecei a criar um laço afetivo
maior com a minha região”.
O segundo momento foi a Exposição
Travessia, lançada em abril de 2015. Em 2014, Lizandra começou a registrar
com o smartphone o percurso que fazia nas barquinhas que ligam Petrolina e
Juazeiro. Utilizava as pequenas embarcações diariamente para ir e voltar da
universidade, onde cursava Pedagogia. A ideia era somente publicar as fotos nas
suas redes sociais. Sua Travessia surgiu despretensiosa, através de uma
sugestão de Chico Egídio, seu companheiro e curador da exposição que reúne 30
fotografias.
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Foto: Lizandra Martins
Exposição Travessia |
Além da fotografia, tem outra paixão: a
literatura. Seu semblante se ilumina quando fala dos autores prediletos. Cita
Ana Cristina Cesar, Caio Fernando Abreu, Hilda Hilst, Euvaldo Macedo Filho. É
como se abrisse as janelas dos cômodos da memória e ventilasse poesia. Tem um
carinho especial por Euvaldo: juazeirense, fotógrafo e poeta. Uma das suas
inspirações no ofício que realiza com tanto amor.
Lizandra também mantém o hábito de
escrever e suas palavras possuem uma particularidade: “escrevo aquilo que não
consigo registrar com a câmera”.
Pegava seu cigarro de palha
Em meio ao cheiro de peixe fresco, ventos e calor
A poesia de Lizandra tem qualquer coisa de filme todos
os sábados às 18h ou “Samba de Orly” tocando repetidamente. E por falar em
Chico Buarque, a sua arte paira como se fosse “feita de luz mais que de vento”.
Victória Rezende é estudante de Jornalismo em Multimeios, matéria produzida em dezembro de 2016 e atualizada em 25 de março de 2017.
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